A nova rodada de resultados do Censo 2010 derrama baldes de água fria na disputa pela nova classe média. É fato que houve mobilidade social, mas a maior parte dos brasileiros continua pobre e sem acesso a condições dignas de vida. Isso, nua e cruamente, é o que revela o IBGE.
Com números oficiais que não comportam paixões partidárias ou ideológicas, o Brasil se assemelha mais a países do mundo subdesenvolvido do que ao planeta dourado que o ex-presidente Lula e sua sucessora tentaram e ainda insistem em vender.
Os dados do IBGE indicam que a renda domiciliar per capita de 56,3% do universo de 57,3 milhões de residências pesquisadas é de até um salário mínimo referenciado em R$ 510. Em 9% não passa de R$ 127, em 18,4% é de até meio salário. A faixa mais dilatada, de 21%, fica entre um e dois mínimos.
A partir daí decresce vertiginosamente. Cai para 7% entre dois e três mínimos e para 5,1 % acima de cinco salários.
No vetor domiciliar per capita, o IBGE considera a divisão do rendimento pelo número de moradores do local, incluindo empregados domésticos, informais e crianças. Mais de 130 mil desse último grupo chefes e arrimo de família. Algo nada alentador para um país que pretende colocação entre os 10 primeiros.
Os indicadores são alarmantes. A coleta de esgoto não chega a 45,5% das residências. E a expansão dos serviços só anda para trás: pela série histórica, o volume de novas ligações diminuiu quase 5 pontos percentuais na última década.
Nesse ritmo, a universalização só aconteceria daqui a 60 anos. Sem canos enterrados, coleta e tratamento de esgoto, não dá para pensar em programas eficazes de saúde pública.
No Nordeste, dos 14,9 milhões de domicílios pesquisados, quase 10 milhões estão fora da rede de saneamento básico. No Norte, a coleta chega a apenas 13,9% dos domicílios.
Pior: dos 3,9 milhões de moradias, 2,4 milhões despejam dejetos em buracos ou diretamente em córregos e rios. Não contam nem com fossas sépticas.
Mais absurdo ainda é constatar que 3,5 milhões de brasileiros não têm sequer um cômodo, interno ou externo, uma parede ou uma simples cortininha, algo que possam chamar de banheiro, com um vaso sanitário.
Na outra ponta, 3 milhões têm três banheiros, 1, 2 milhões quatro ou mais, escancarando o tamanho do fosso.
Governos, políticos e seus partidos deveriam mirar os números parciais do 12º Censo, e, antes de se digladiarem pelos votos dos novos médios, intensificar, e muito, a luta para que eles tenham um mínimo de dignidade.
Eliminar o fosso que condena a muitos a não ter nem mesmo uma fossa.
Mary Zaidan é jornalista, trabalhou nos jornais O Globo e O Estado de S. Paulo, em Brasília. Foi assessora de imprensa do governador Mario Covas em duas campanhas e ao longo de todo o seu período no Palácio dos Bandeirantes. Há cinco anos coordena o atendimento da área pública da agência 'Lu Fernandes Comunicação e Imprensa, @maryzaidan
Fonte: Blog do Noblat