Só 3,2% dos analfabetos do país estudam
ANTÔNIO GOIS
da Folha de S.Paulo, no Rio
LUCIANA CONSTANTINO
da Folha de S.Paulo, em Brasília
Nos últimos 25 anos, o Brasil fez a transição da ditadura militar para a democracia e teve seis presidentes. Todos, com maior ou menor ênfase, tentaram atacar o problema do analfabetismo adulto. Todos fracassaram no mesmo ponto: não conseguiram atrair os analfabetos para a sala de aula.
Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios do IBGE tabulados pela Folha mostram que o percentual de analfabetos que freqüentam escola ou curso de alfabetização variou de um percentual de apenas 1,0% em 1981 a uma proporção igualmente ínfima de 3,2% em 2005. O Brasil tem, segundo os dados do IBGE, 14,6 milhões de pessoas com mais de 15 anos que não sabem ler nem escrever, o que dá 11% da população adulta.
Um dos motivos que explicam a dificuldade de trazer essa população para a sala de aula é o fato de mais de um terço dela (38% do total) ter mais de 60 anos. Esse grupo, segundo o MEC, é o que menos procura os cursos de alfabetização.
No caso dos que têm menos de 60 anos, o Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais) elaborou um estudo, apresentado aos governadores do Nordeste no mês passado, que traça o perfil desses analfabetos.
Desse contingente de analfabetos entre 15 e 60 anos (9,6 milhões no total), 40% moram na zona rural, onde o acesso à escola é mais difícil, 38% têm mais de 30 anos e 48% já freqüentaram a escola. A maioria (69%) é economicamente ativa (trabalha ou procura emprego). Porém, dos empregados com carteira assinada, apenas 2,8% são analfabetos, significando que programas de alfabetização em fábricas ou empresas são pouco eficazes.
Descompasso
A promessa de campanha no primeiro mandato de Lula era erradicar o analfabetismo em quatro anos, atendendo 20 milhões de analfabetos. Os resultados, no entanto, não apareceram e o ritmo de redução da taxa de analfabetismo, em vez de acelerar, diminuiu. De 2002 a 2005, o número de analfabetos caiu em apenas 213 mil.
O descompasso entre os resultados obtidos e os investidos no programa levaram o MEC a anunciar mudanças no mês passado. Só em 2006 foram investidos R$ 200 milhões para atender 1,5 milhão de alunos.
Além de continuar não atraindo a população analfabeta para sala de aula, uma pesquisa do próprio MEC divulgada no mês passado apontou que um terço dos matriculados falta de duas a três vezes por semana às aulas, comprometendo o aprendizado, já que o curso dura até oito meses.
Nos últimos 40 anos, a efetividade dos programas de alfabetização, incluindo a primeira etapa do Brasil Alfabetizado, foi baixa, mesmo quando os atendidos foram somente os analfabetos, avalia o ministro Fernando Haddad (Educação).
Após três anos de funcionamento, o Brasil Alfabetizado terá a partir deste ano a alfabetização de jovens e adultos feita por professores das redes estaduais e municipais. Até 2006, as aulas eram ministradas apenas por alfabetizadores leigos-pessoas que faziam cursos de capacitação para alfabetizar jovens e adultos. Esses leigos continuarão em turmas oferecidas por ONGs.
Porém, o MEC pretende incentivar os governos estaduais e municipais a apresentarem planos de trabalho para reduzir o analfabetismo até 2010, com a inclusão de professores da rede pública no programa.
Os governos ficarão responsáveis pela identificação e abordagem dos analfabetos, além da seleção e capacitação de professores alfabetizadores da rede pública. Essa atribuição de capacitação poderá ser repassada a ONGs ou universidades.
O ministério pagará bolsa mensal entre R$ 120 e R$ 260 diretamente ao professor que aceitar participar do programa em turno diferente do que ele ministra aula na rede pública. Para fazer o pagamento, será necessário um projeto de lei ou medida provisória, já que esse tipo de repasse extra não é previsto na legislação atual.
O MEC pretende oferecer transporte escolar e recursos para óculos aos alunos com problemas de visão. Estuda-se também o fornecimento de merenda aos estudantes.