O Estado de S. Paulo
Hoje 1,2 bilhão de pessoas sofrem com a escassez de água. Outros 2,6 bilhões de pessoas não dispõem de coleta de esgoto adequada. Nesse cenário, e com a progressiva piora do acesso aos recursos naturais provocada pelo aquecimento global, a Organização das Nações Unidas alerta para o risco de conflitos armados pelo controle de mananciais, tanto entre nações como de grupos rivais num mesmo país.
Para dar o devido destaque a esses números e projeções, a ONU declarou 2008 o ano do saneamento. E antecipou para hoje em Genebra a comemoração do Dia Mundial da Água - a data formal, 22 de março, coincidiria com o feriado da Páscoa. A falta de saneamento, que ocorre até mesmo em países do Primeiro Mundo, põe em risco a sobrevivência de pessoas e a preservação de mananciais. Quando não causa mortes, aumenta os gastos com atendimento médico. Segundo a Organização Mundial da Saúde, 6% de todas as doenças são causadas por consumo de água inadequada, falta de coleta de esgoto e de higiene. Só a diarréia, principal moléstia relacionada ao problema, mata mais de 2 milhões de pessoas por ano - pelo menos 1,5 milhão delas são crianças com menos de 5 anos. É a segunda principal causa de mortalidade infantil no mundo - perde apenas para a pneumonia.
Em artigo publicado hoje na revista científica Nature, Jamie Bartram, coordenador do Programa de Água, Saneamento e Saúde da OMS, lembra que, em meados do século 19, a Europa tomou consciência do problema e fez investimentos maciços para controlar surtos de cólera e febre tifóide, em uma ação que foi considerada uma das mais importantes para o avanço da saúde na história. “Lamentavelmente, vergonhosamente, 150 anos depois da ‘revolução sanitária’, as conseqüências da falta de saneamento permanecem devastadoras.”
A OMS apela para que novos investimentos sejam feitos para cumprir os Objetivos do Milênio, que prevêem que até 2015 o número de pessoas sem esgoto coletado caia à metade. “E, mesmo se isso ocorrer, 875 milhões ainda estarão coletando água a distância, de fontes não protegidas, e 1,7 bilhão de pessoas não terão nem uma simples latrina em casa”, alerta Bartram.
No Brasil, a situação é preocupante. Pouco mais de 48% da população dispõe de coleta de esgoto. Do total recolhido, só 32,2% são tratados, segundo o Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento. Estudo feito pela Fundação Getúlio Vargas com o Instituto Trata Brasil indica que, no ritmo em que o sistema tem se expandido nos últimos anos, o País só será capaz de cumprir a meta da ONU de coleta de esgoto em 56 anos. Para universalizar o acesso a esgoto tratado, só em 2122. O governo federal reconhece que houve atraso do setor, apesar da melhoria no fornecimento de água, que hoje chega a 93,1% da população. E espera que com o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que prevê investimentos de R$ 10 bilhões em saneamento até 2010, o Brasil recupere o tempo perdido.